Repassando o carnaval 2013 (parte 9): Favo de Acari

Ah, Acari… Quem não se lembra da música do MC Batata que fez muito sucesso no fim dos anos 80 (vídeo), contando a história de um camelódromo uma feira que vendia praticamente tudo? O famoso lugar era apelidado de “Robauto”, tal a quantidade de peças e rádios de carro que eram vendidos ilegalmente sem nota fiscal. A feira ainda existe, mas não possui mais o “glamour” daquele tempo.
E é neste bairro que fica localizada aquela que eu posso chamar de “escola do meu coração”, o Grêmio Recreativo Escola de Samba Favo de Acari. Como citei no post da “musa da Saara”, os motivos pelo qual torço por ela são desconhecidos até por mim, mas o fato é que, desde que descobri a existência desta agremiação, fixei como meta desfilar nela todos os anos, rejeitando até convites de escolas do grupo especial. 

Entrada da quadra da escola

Chegar até o mestre de bateria da escola até que não foi muito difícil. Mestre Ronaldo  é  um dos mais conhecidos mestres de bateria do carnaval carioca e várias pessoas me passaram o seu contato. Enérgico e muito exigente, não é à toa que a “Pura Explosão” tem ganhado tantos prêmios de melhor bateria nos últimos anos. 

Mestre Ronaldo

Cuiqueiros da “Pura Explosão”

Rainha da bateria

E como valeu a pena ter rejeitado o convite de uma escola do grupo especial para sair na  minha escola do coração (embora isso fosse óbvio). Quando comecei a tocar, pensei que talvez eu fosse um dos poucos ritmistas ali que realmente era torcedor da Favo, mas isso não importou nem um pouco, só me fez ter mais vontade de fazer a cuíca roncar mais alto, pra me sentir ainda mais responsável pelas notas da bateria (todas 10, aliás). Foi um bocado emocionante.     

A agremiação desfilou com o enredo “Muito Prazer, Sou Acari em Verde, Rosa e Ouro. E a Favo faz a Festa na Intendente!”, do carnavalesco Humberto Abrantes. O samba-enredo foi um dos pontos fortes, sendo cantado o tempo todo pelos componentes, o que certamente contagiou a quem compareceu à estrada Intendente Magalhães no domingo de carnaval.

Carro abre-alas

O casal de mestre-sala e porta-bandeira também deu um show à parte:


E, por último, mas não menos importante, o vídeo do desfile da MINHA escola. Curtam:

ACARI, MEU TESOURO, EM VERDE, ROSA E OURO!!!

Papo de bamba – Kazumi Shimizu – Uma japonesa no samba

Uma japonesa apaixonada pelo samba. É assim que ela se define. Kazumi Shimizu, ou Kazumi da cuíca, como prefere ser chamada, é vice-diretora da GRES Saúde Yokohamangueira, a atual bicampeã do carnaval japonês, e fundadora da confederação dos cuiqueiros do Japão, uma associação cujo principal objetivo é difundir a cuíca na terra do Sol nascente. Confira o bate-papo que tivemos com essa pioneira:

Desfile GRES Yokohamangueira
Desfile da GRES Yokohamangueira

Cuiqueiro: Como surgiu o seu envolvimento com o samba?
Kazumi Shimizu:  O carnaval em Asakusa (uma cidade do Japão) existe no Japão há 32 anos. Comecei na percussão há 25 anos e o meu professor me pediu uma ajuda. Desde então, estou na bateria.

Cuiqueiro: Por que escolheu a cuíca?
K.S.: Eu gosto do som da cuíca. Acho que é o instrumento mais atraente na bateria.

Cuiqueiro: Na sua escola, há brasileiros tocando também?

K.S.: Brasileiros que vivem no Japão não participam das escola de samba. Acho que não gostam muito ou simplesmente tem que trabalhar demais para se manter aqui.

Cuiqueiro: Já veio ao Brasil?

K.S.: Ainda não. É meu sonho.


Kazumi da cuíca


Cuiqueiro: Já pensou em tocar em uma escola de samba do Rio de Janeiro?

K.S.: Claro que sim! Mas ainda não consegui por causa do trabalho e minha família.

Cuiqueiro: Como consegue os instrumentos? São vendidos aí no Japão?

K.S.: Eu toco cuíca, surdo e caixa. Em Tóquio, há uma loja de instrumentos do Brasil, mas, mesmo assim, conseguir peças para cuíca é bem difícil.

Cuiqueiro: O que você espera do carnaval no Japão? Está crescendo bastante?

K.S.: Os japoneses são muito interessados no samba. Com exceção do Brasil, o carnaval no Japão é o maior do mundo e a tendência é que o número de admiradores aumente ainda mais.

Cuiqueiro: Deixe um recado aos brasileiros.

K.S.: Há muitos japoneses que amam samba. Queria que os brasileiros conhecessem o samba que a gente faz aqui do outro lado do mundo.

Repassando o carnaval 2013 (parte 8): Flor da Mina do Andaraí

Um ano “quente” e infeliz para uma escola tão tradicional… e eu fui o diretor das cuícas!

Símbolo da Flor da Mina do Andaraí.
A Flor da Mina é uma escola muito tradicional no Rio de Janeiro. Fundada em 1962 no alto do morro do Andaraí, teve seus anos de glória no início da década de 90 quando, contando com o apoio de Miro Garcia (presidente do Salgueiro à época), que se tornou patrono da agremiação, apresentou belíssimos carnavais. No entanto, nos últimos anos vem amargando seguidos rebaixamentos, manchando sua rica história…


Quadra da Flor da Mina.
Quadra da escola
Comecei a fazer parte da escola por acaso. Conheci o presidente da escola, Carlinhos Melodia, em um destes sambas da vida. Ele me disse que estava tentando levantar a escola no carnaval de 2013 e precisava de pessoas dispostas a ajudar. Ora, era óbvio que eu poderia fazer alguma coisa. A partir deste dia virei, “oficiosamente”, o diretor de cuícas.

Carlinhos Melodia
Carlinhos Melodia, presidente da escola

O ponto negativo de trabalhar em uma escola que está no grupo de acesso D é que ninguém, absolutamente ninguém, fica empolgado para ir ao ensaio da bateria. Você acha muita gente para tocar, mas sempre naquele esquema de pegar a fantasia na semana do carnaval e aparecer para o desfile. E isso faz muita diferença…

Bateria Atrevida.
Bateria “Atrevida”
camisa da bateria
Detalhe da camisa da fantasia da bateria


Digo isso porque o mestre Alex ainda conseguiu impor um ritmo gostoso à bateria “Atrevida”, que sacudiu quem compareceu à Intendente Magalhães na terça-feira de carnaval. A Flor da Mina estava bem, exceto por um detalhe…


Incêndio
Ficou difícil para a escola depois do incêndio (fonte: O Dia)


No dia 31 de outubro ocorreu um incêndio na zona portuária que destruiu o barracão da Flor da Mina (leia a reportagem aqui). É óbvio que um incêndio destas proporções tão próximo do carnaval causa arrepios em qualquer um que tenha ligação com a escola. Não se falava, mas as chances de realizar um desfile bonito acabavam ali. A fantasia da bateria, que prometia ser um dos destaques, não foi mais do que uma calça branca, uma camisa do enredo e um chapéu. Era nítido o desapontamento.


O Andaraí ainda existe!
Entretanto foi surpreendente. Quem esperava um desfile triste e sem emoção, viu justamente o contrário. As fantasias eram muito simples, pois tudo havia sido queimado, mas o carro alegórico e a diretoria foram muito aplaudidas, tirando lágrimas de alguns integrantes da velha guarda, que eram os mais empolgados.

Carro alegórico.
O carro alegórico foi um ponto alto do desfile

No fim, ah, deixa o fim pra lá… apenas cliquem em “play” e curtam o show!


Repassando o carnaval 2013 (parte 7): Império da Praça Seca

Mais uma escola de samba. Agora é vez de uma das maiores surpresas do carnaval 2013 (ao menos para mim). Como já comentei em outros posts, sou relativamente novo no mundo do samba, e nunca tinha ouvido falar da do Império da Praça Seca, que durante um curto período de sua história chegou a ser chamado de Império do Mato Alto, por ser lá o local onde fica a quadra.

Sou devoto de São Jorge, e o enredo foi mais um motivo para me aproximar da escola

Para quem não entende como funciona o carnaval do Rio de Janeiro, o Império está ligada a AESCRJ, e desfilou no domingo de carnaval na estrada Intendente Magalhães, no bairro do Campinho. Se a escola vencesse, participaria, pela primeira vez, do carnaval no Sambódromo. Por ser uma escola muito nova, fundada em 2009, a ascensão dela é considerada meteórica, graças, muito em parte, ao competentíssimo carnavalesco Rodrigo Almeida e ao presidente Rodrigo Avelar.

As fantasias das alas estavam muito bem feitas (Fonte: Arquivo Pessoal)
Destaque para o bonito carro alegórico homenageando o Santo Guerreiro (Fonte: Arquivo Pessoal)

Além da beleza das fantasias e alegorias, um outro ponto alto foi o samba-enredo, um dos mais bonitos de 2013:
A bateria “Tsunami”, comandada por mestre Bira, que é diretor de naipe em algumas escolas da Sapucaí, veio muito afinada. Como os ensaios vinham ocorrendo desde julho, as bossas  foram executadas com perfeição. Também foi muito elogiado o efeito de chuva de papel picado nas paradinhas.

Olha uma tocadora de cuíca cuiqueira aí! (Fonte: Internet)
Bateria se aprontado (Fonte: Internet )
A princesa da bateria (Fonte: Internet )
Veja o vídeo do desfile:

O terceiro lugar que a escola conseguiu foi muito comemorado, apesar de não ter conseguido o acesso ao grupo A, pois o Império conseguiu se colocar como uma força e grande favorita ao título em 2014.

Repassando o carnaval 2013 (parte 6): Unidos da Vila Santa Tereza

Uma tragédia anunciada nas entrelinhas… e eu na linha de frente!

O enredo da escola para 2013

“Putz, vou ter a chance de tocar um dos sambas-enredo mais bonitos de 2013”, foi a primeira coisa que pensei ao ser convidado para tocar na Unidos da Vila Santa Tereza. O tema, relacionado à África, já tão batido ao longo dos anos, havia recebido um tratamento pra lá de legal nesta composição. Além do mais, não havia meios de dizer não ao diretor do naipe da escola, parceiro de linha da Imperatriz Leopoldinense. Some-se a isto o fato de que era o primeiro dia de carnaval na cidade, eu não tinha nada pra fazer e o desfile era cedo. Mal sabia eu que a noite seria bem mais longa do que o planejado…

Quadra da Vila Santa Tereza
Quadra da escola em Coelho Neto

Não demorou para sentir que havia algo de estranho. Na semana anterior ao carnaval, fui informado que a fantasia, que eu pegaria um dia antes do desfile, só seria entregue no dia, na hora do almoço. Até aí, tudo bem, já que muitas agremiações fazem isso mesmo, tendo em vista os vários atrasos (falta de grana) que ocorrem. O problema começou quando, na sexta-feira às 11 da manhã, recebo uma ligação do diretor do naipe avisando que a entrega havia sido cancelada e que só ocorreria na concentração. “Xiii, tem caroço nesse angu…” Ora, isso acontece nas escolas da Intendente Magalhães, onde os ritmistas são praticamente catados no laço, mas na Sapucaí? “Hum, sei não”… “há algo de podre no reino da Dinamarca”, diria o sabido Hamlet.

Pavilhão da Unidos da Vila Santa Tereza
Salve o pavilhão azul e branco!

Para me precaver, cheguei à concentração por volta das 20h. Com a previsão de início do desfile por volta das 21h40min, eu teria tempo mais do que disponível para reencontrar os amigos, me arrumar, bater um papo e afinar a “chorona”, o que sempre deixo por último. Muitos ritmistas já estavam aguardando, porém o caminhão com os instrumentos não tinha chegado, bem como as fantasias mas, quando fui questionar, me diziam para ficar tranquilo, não esquentar que não era nada demais. Sei… Até que…
Mestre Dó
Mestre Dó (Fonte: Internet)

Vi o mestre Dó cercado de gente. Ouvi uma gritaria e muito choro. Não demorou para todo mundo se aproximar para saber o que era aquilo. “Mas o que é que tá acontecendo?” era a pergunta que mais se fazia.
Bateria Vila Santa Tereza
Galera da bateria “Pegada de King” (Fonte: Internet)

“Não tem fantasia? Como não? Tá de sacanagem, né?” – pronto, tudo estava explicado. A história atingia seu ápice. Nós entraríamos na avenida sem as tão ansiadas roupas. Alguns, visivelmente transtornados, foram embora. Outros, mais empolgados, achavam que fariam história por aparecer na televisão daquela maneira. Não achei que faríamos história, mas deixar os colegas na mão não era opção.

Na hora que o batuque começa, a fantasia é um mero detalhe (Fonte: Internet)

http://youtube.googleapis.com/v/pIrhBLDz2vE&source=uds
Partimos rumo ao sambódromo. Tal qual mercenários de um exército sem nome, não tínhamos uniforme. Cada um por si. Todos nos olhavam, com aquele olhar de curiosidade e espanto. Nós também olhávamos. Fora os ritmistas, tudo na escola parecia muito bonito e organizado, quando…

Confesso, eu achei que a calcinha e o sutiã eram fantasias (Fonte: Internet)

Passamos por uma ala e ouvimos mais reclamações acalentadas. Incrível, a escola havia desrespeitado dois de seus maiores estandartes, a bateria e os passistas (mais tarde soube que as baianas também passaram pela mesma situação). E eles estavam como nós, sem a prometida vestimenta. “Por que a bateria não vem assim também? Todo mundo nu!”, bradou uma passista, para risadaria geral. Isto, de algum modo, acalmou os ânimos dos mais exaltados. Alguns deles também foram embora, com vergonha de se exibirem daquela maneira. Não os culpo. Talvez fizesse o mesmo.

“Todo mundo nu!" (Fonte: Internet)

Quando chegamos ao nosso ponto de encontro, algumas calças brancas surgiram misteriosamente. Uma correria. Alguns pegaram, outros não (incluindo eu). Não havia em número suficiente para todos. Camisas também apareceram mas, semelhante às calças, eram poucas. A única coisa que chegou para todo mundo foram os pares de sapatos azuis. A ordem foi para que os usássemos. Revendo hoje, fica óbvio que não fez diferença alguma.
Entrando na avenida (Fonte: Internet)

Já estávamos prontos e formados. Só faltava uma pessoa. A rainha da bateria. Ariadna Thalia. A primeira transexual a participar do Big Brother Brasil. Capa da Playboy. Ex-moradora de Realengo. Mas é claro que eu estava querendo vê-la de perto. E olha, pra ser bem sincero, se eu não conhecesse a história, e ela fosse colocada lado a lado com outras rainhas, e me fosse perguntado qual delas já tinha tido um bilau, não diria que era ela. Simpática e acessível, Ariadna também não desfilou com a fantasia completa (os seios foram tapados na hora), entretanto riu o tempo todo.

Ariadna Thalia, a rainha da bateria
Ariadna Thalia (Fonte: Internet)


Contamos com a simpatia dos espectadores no sambódromo, que nos aplaudiam e tentavam nos animar. Não era necessário, uma vez que todos nós ali estávamos nos divertindo e muito tranquilos (me senti bem confortável, aliás, perto de algumas fantasias que os carnavalescos inventam para a bateria). 

No fim, aconteceu o que todos imaginaram. A Unidos da Vila Santa Tereza ficou em último lugar e foi rebaixada. Triste, mas muito justo.

Segue aí um compacto do desfile:



Só pra não perder a piada pronta, deu dó do mestre Dó.